terça-feira, agosto 22, 2006

Pentalética, ou a vitória das esquerdas

Assim ficou este articulista ao descobrir a pentalética


Deus, na sua infinita bondade, oferece aos homens uma porta generosa, porém estreita, para a sabedoria, mas também o pleno direito de serem estúpidos por conta própria. Talvez por isso, as mais importantes atividades humanas tenham tanta atração para todo o tipo de malucos. A religião, onde vamos em busca da transcendência e de consolo para as nossas angústias, assim como a política, onde procuramos definir rumos para solucionar os problemas práticos e de gestão da vida em sociedade têm, ambas, uma inigualável capacidade de atrair pirados e messiânicos com variadas espécies de delírios. Quando as duas coisas se unem, então, é dinamite pura. Uma fagulha de fanatismo e o desastre está feito. Longe de mim negar, é claro, os benefícios da fé e a importância da ação política consciente e refletida. Só lamento que os piradinhos se motivem tanto com tais assuntos e, às vezes, até acabem tendo grande influência neles.

Há alguns anos, fiquei perplexo ao escutar um professor de filosofia, no rádio, com estilo que lembrava muito Quincas Borba, o personagem de Machado, explicando haver desenvolvido uma teoria luminosa que representava grande avanço em relação à dialética, considerada por ele superada pela sua descoberta. Em resumo era o seguinte: a dialética dispunha, como alavancas explicativas e promotoras do conhecimento, da tese, da antítese e, a partir daí, gerava a nova síntese. Ora, ignorava-se assim que esse jogo criativo entre tese e antítese (dois elementos, portanto) não se dava sem a interferência de um terceiro elemento, que era o “agente de mudança”. Com isso, passávamos a ter, segundo o professor, a “trialética”, através da qual ele explicava os mais obscuros segredos do universo e de forma muito mais convincente do que pela simples dialética. Superado o susto e o impacto inicial, decidi que era preciso ir um pouco mais adiante e, numa apoteose pessoal de iluminação descobri, eu próprio, a “pentalética”. Vejam os senhores se não tenho razão: se existe o “agente de mudança”, com certeza podemos incluir, também, o “agente de resistência”, ou seja, o agente que se opõe à mudança. Mas, para chegar à síntese, acato a idéia do nosso Quincas Borba de que é preciso uma força adicional e aí reside a originalidade da minha contribuição. Não pode ser o agente de mudança porque ele é neutralizado pelo agente de resistência e, portanto, essa força criadora é o “resto”. Temos cinco elementos: a tese, a antítese, o agente de mudança, o agente de resistência e, finalmente, o resto. Para chegarmos à síntese, quem decide, de fato e verdadeiramente, é sempre o resto. Eis a revelação.

Assim como a dialética hegeliana, que não foi concebida com vistas a favorecer as ditas esquerdas, mas lhes permite jogar no lixo os elementares princípios da lógica e da contradição, a “pentalética” parece, também, estar fadada ao mesmo sombrio destino. Relembrei a minha descoberta filosófica agora, ao rememorar o processo eleitoral para a Presidência da Câmara dos Deputados e, como não poderia deixar de ser, quem decidiu foi o resto. Havia a tese e a antítese, representadas por governo e oposição, os agentes favoráveis a uma e à outra e, finalmente, havia o resto. E os componentes do resto decidiram cooptados, sem dúvida, por alguns estímulos adequados à sua elevada estatura moral. Triste sina a nossa: estamos à mercê do resto e dos seus valores um tanto instáveis.

O supremo apedeuta mostrou-se, até, todo alegrinho e gabola, enquanto representava seu teatrinho com o Napoleão de hospício venezuelano e estreou uma novidade, segundo nos alertou Reinaldo Azevedo na revista "Primeila Leitura": uma mesóclice. Não se pode negar o progresso. Do tempo da “menas maracutáia” até chegar a uma mesóclise o esforço foi grande e se o homem não estudou, pelo menos foi adestrado. A esperteza já lhe era inata.

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