quinta-feira, janeiro 25, 2007

BUSH, CHURCHILL E O IRAQUE!

1. Quando os políticos tomam decisões no Brasil levam em conta - no máximo - o período republicano. Os europeus trabalham com um período de tempo muito maior, de pelo menos mil anos. Especialmente pela memória que a monarquia incorpora.

2. O Oriente Médio - até a primeira guerra mundial - era território do Império Otomano. Os turcos vieram da Ásia Central e assimilaram o islamismo, mesmo não tendo raízes árabes. Durante o século 19 - vide guerra da Criméia - Grã-Bretanha, França e o I. Otomano cuidavam dos riscos de uma expansão russa. Na primeira guerra mundial - em função da aliança da Rússia com França e GB - os otomanos se somaram a Alemanha e ao I. Austro-Húngaro.

3. Como o Sultão era ao mesmo tempo Califa, a declaração de guerra era de guerra santa com todos os riscos de desestabilização aos aliados a partir do Oriente Médio. Com isso estimularam ao xarife da Meca - Hussein - e seus filhos - Abdulá e Faiçal- a aproveitar e reagir contra o Império Otomano, criando uma revolta árabe. Com isso a declaração de guerra santa perdeu o sentido e toda a região passou a ser de "mandato" britânico e francês. Para a GB o ponto principal era o canal de Suez e com isso o Egito foi incorporado na frente. O tratado de Versailles é afago perto do Tratado de Sévres entre os aliados e o que passou a ser a Turquia.

4. Para Churchill a jóia da coroa era a Índia e os demais espaços cumpriam uma função geopolítica de estabilização. Não via o petróleo estrategicamente. A França se encarregou da Síria e do Líbano e a GB da Palestina, da Mesopotâmia, dos reinos onde hoje é a Arábia Saudita e da Pérsia. Os filhos de Hussein - amigos do coronel Lawrence (da Arábia) - e em contato estreito com os britânicos, foram deslocados para a Síria (Faiçal), e para a Transjordânia (Abdulá) depois. A França destrona a Faiçal que passa a ser a peça britânica para dar solução a Mesopotâmia (depois Iraque). O comissário britânico para a Palestina - sionista - insiste com Churchill (também filo-sionista) para a criação naquele momento do estado de Israel, o que provavelmente produziria, muito antes do nacionalismo árabe, conseqüências muito diferentes das atuais.

5. Na famosa Conferência do Cairo - 12 a 27 de março de 1921 - onde o governo britânico discutiu internamente o que fazer com o Oriente Médio, e quando as posições internas de seus ministros e do primeiro ministro - Lloyd George (que ficou em Londres como última instância) eram muito conflitantes, as decisões que desenharam o Oriente Médio como conhecemos foram tomadas.

6. Churchill - com visão de um império britânico declinante - insistia que não havia como financiar todos os pontos de ocupação britânica no mundo todo. Por isso pensava em soluções onde a presença militar britânica seria fortemente reduzida, mas com implantação de governos de confiança. O quadro havia mudado. A Rússia - agora bolchevique - passava a ser uma enorme preocupação estratégica para Churchill. Os gregos haviam invadido a Anatólia (a região de Ankara da Turquia). O nacionalismo turco (que surge bem na frente do nacionalismo árabe) reage. Os aliados se dividem. Lloyd George - ao contrário de Churchill - simpatiza com os gregos (que terminaram sendo vencidos pelos turcos). Para Churchill, o fundamental na região era sua estabilização por razões geopolíticas e para isso, os turcos - restritos a Turquia - cumpriam um papel muito mais importante.

7. O candidato de Woodrow Wilson - que defendia a autodeterminação daqueles povos e a Liga das nações, perde as eleições de 1920 e os EUA adotam posição de isolamento em relação ao pós-guerra, naquele momento.

8. Hussein - o pai de Faiçal e Abdulá - inicia movimentos de autonomia. Ibn Saud é estimulado pelos britânicos a ir deslocando-se em direção à região de Meca e Medina. Finalmente assume a região e a expande. Em 1932 cria a Arábia Saudita (de Saud seu nome) e troca de parceiros alugando o petróleo para os EUA.

9. Faiçal é entronado rei do Iraque (com este novo nome) a fins de 1921 e assume postura de relativa independência. Churchill tenta, mas infelizmente não consegue criar um Estado tampão dos Curdos - entre o Iraque e a Turquia. A decisão de criar o Estado de Israel é postergada e substituída por uma colonização progressiva. Os franceses - ao contrário dos britânicos - querem cristianizar o Líbano e a Síria. Erram e o Líbano de hoje é exemplo. Churchill diz que o Império britânico é a maior nação maometana do mundo (na Índia) e que não há porque, tentar mudá-los.

10. A Conferência do Cairo decide - em grande medida - pelas propostas de Churchill e os britânicos reduzem na região suas tropas de forma substantiva, deixando que os reinos criados com seus amigos, mesmo que assumam posição de autonomia, fiquem no poder aliviando os gastos britânicos.

11. Nas conferencias e depois nas comissões de acompanhamento, seja na GB, seja na França, como nos EUA, hoje, há sempre historiadores analisando as raízes do quadro que se enfrenta. A Conferencia do Cairo de 1921, e seus desdobramentos, são vistos hoje pelos establishments da GB e EUA, como razões do quadro atual enfrentado no Oriente Médio.

12. E com isso não querem repetir os erros e recuar. Por isso mesmo a nova ofensiva na Somália com base na Etiópia, a substituição de tropas no Kuwait, a mudança do comando militar no Iraque e a expansão dos efetivos em mais 20 mil homens.

13. Nem tão mal foi assim o 12 de março de 1921 para a GB e EUA de hoje. Afinal, a linhagem da Jordânia é a mesma e hoje Abdulá II é o bisneto de Abdulá filho de Hussein e irmão de Faiçal, transferido da região da Meca para a Transjordânia. Da mesma forma a linha de Saud na Arábia Saudita, permanece e amiga dos EUA.

14. A decisão atual de ampliar a ofensiva não tem como matriz os problemas de hoje, mas as raízes de ontem e vai prosseguir, por mais que pareça irracional aos que olham com os olhos de 2003 para cá e dos erros cometidos na recente ocupação do Iraque.

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