sexta-feira, dezembro 21, 2007

REFORMA POLÍTICA!

1. No momento crucial da transição espanhola á democracia, o presidente de governo - deputado Adolfo Suárez - fez um longo pronunciamento na TV, de uns vinte minutos. Essa é uma peça histórica. Adolfo Suárez, em resumo diz, que definir uma nova Constituição, começa pela Reforma Política, pois é essa que dará representatividade e legitimidade a Assembléia Constituinte a ser eleita. Ou seja: para Suárez a Reforma Política precede a Constituição. Quando avaliamos o que ocorreu no Brasil - com uma constituinte construída pelo fracassado plano cruzado -, ou mesmo em Portugal, com o entusiasmo da revolução dos cravos, e o que ocorre na Venezuela, Bolívia e Equador, onde por razões de oportunidade eleitoral se constroem constituições à imagem e semelhança das ambições de poder do caudilho de plantão, é que se pode falar da fragilidade das instituições posteriores o que exigiu amplas reformas constitucionais no Brasil e em Portugal e exigirá,certamente, naqueles três outros países.

2. O discurso completo de Adolfo Suárez na rede de TV está no livro "Los Discursos del Poder" Editorial Belacqva - Barcelona. Esse Blog transcreve abaixo, trechos selecionados de A Soberania Pertence ao Povo - Adolfo Suárez - Madrid 10 de outubro de 1976.

3. Falar de política para um Chefe de Governo significa intentar afastar incógnitas e clarificar objetivos que perseguimos... Apresento aqui, um Projeto de lei para a reforma política ... Mas a opinião pública exige fatos e, com eles, queremos responder ... É um projeto simples e realista, que trata de servir de canal formal para que o povo possa desempenhar o protagonismo que lhe corresponde.

4. Evidentemente, podíamos sentir a tentação de redigir uma Constituição completa e distinta, reguladora de todos os aspectos da vida política. Preferimos, contudo, dar um passo para a legitimidade aos grupos e aos partidos, por meio do voto. Com este último, começamos a converter em realidade o que já disse em certa ocasião: elevar à categoria política de normal o que, nas ruas, é simplesmente normal, retirando dramatismo e ficção da política por intermédio de eleições.

5. O Governo que presido não se coloca na vida política com uma simples e provavelmente demagógica substituição das classes dirigentes ... Mas se trata também de que a Espanha encontre um ambiente favorável para formar uma grande política de Estado que precisa da colaboração de todos na parcela de trabalho ... É necessário evitar cair numa dessas tentações: partir do zero, desconsiderando o que constitui nossa própria História e o conjunto de fatos que enche mais vidas, ou o que ignora a transformação real que se está operando em todos os segmentos da sociedade espanhola.

6. O Governo se defrontou com três tipos de necessidades, que requerem três tipos de ações. A primeira é facilitar a transição. Resolveremos isso com a lei de reforma política anunciada. Significa reconhecer a voz do povo ... Enquanto não forem afastadas as incógnitas políticas, que gravitam em torno do país, não poderá haver nem a reativação, nem a estabilidade da economia. Há aí um ponto adicional para nos demonstrar a inter-relação dos processos econômicos e políticos e uma transcendental razão acrescentada, pela qual, enquanto reordenamos a economia, teremos de acometer, com toda a claridade, rapidez e firmeza, a importante operação de nossa reforma política.

7. As tarefas da reforma não farão que se esqueçam nossos objetivos como nação. Vamos começar um grande debate nacional sobre nosso futuro. .... Trata-se da definição de uma grande política de objetivos nacionais comuns, que não possa ser rechaçada de maneira fundamentada por nenhum grupo, por nenhum partido, por nenhuma instituição que participe da essência desta comunidade de idéias e de interesses que chamamos de Espanha. Tenho consciência da dificuldade dessa grande política de Estado, das mudanças de governo, da diversidade de opinião,do exercício de opções e alternativas pluralistas e distintas.

8. Mas não é lógico que cada governo, que chegue ao poder, mude os objetivos, cuja consecução só se logra por meio de longos anos de esforços continuados das grandes linhas da política exterior; o projeto de fazer uma Espanha mais humana e personalizada, que responda a esquemas básicos de política educativa e cultural; a elevação do nível de bem-estar daqueles que não alcançaram um mínimo justo e tantas outras coisas, não pode ficar submetida a alternativas circunstanciais.

9. Por isso, hoje, que é um dia a mais na política espanhola, quero dirigir-me a todas as mulheres e a todos os homens da Espanha. Quero, em nome do Governo, convidar todos a um acordo básico. ... Sobrepor, durante o tempo que dure a construção de nosso novo horizonte, os interesses gerais aos particulares. ... Nosso tempo fala de novas aspirações. Fala de centrar nosso papel no equilíbrio político do mundo. Fala de criar novas ilusões coletivas; fala, em definitivo, de uma grande solidariedade nacional em prol de um futuro de prosperidade.

10. Teremos a confiança de que nada do que espere o povo espanhol no futuro possa ser mais difícil do que superar o que já foi resolvido no passado. ... Diante desse povo, cuja politização é a simples, mas soberana, politização de querer decidir seu futuro, e decidir em paz, com ordem e segurança, queremos comparecer hoje. E repetir, uma vez mais, que o futuro não está escrito, porque só o povo pode escrevê-lo. Para isso, ele tem a palavra. O Governo, que presido, preparou os instrumentos para que possa expressar-se com autenticidade. Para garantir, em definitivo, sua soberania. A soberania do povo espanhol.

Nenhum comentário: