segunda-feira, julho 14, 2008

"Cem dias de irresponsabilidade"!

Trechos do artigo do politólogo e historiador argentino, Natálio Botana (foto) no La Nacion.

1. Estamos sendo arrastados por uma onda de irresponsabilidade. O meio específico da política, sabe-se, é o poder, mas este instrumento pode transformar-se numa roda louca, que gira numa velocidade crescente sobre ela mesma e obscurece, naqueles que estão montados sobre ela, a visão do mundo que os rodeia. Esta metáfora pretende assinalar que estamos perdendo certos atributos, sem os quais a política resulta numa ação dominada pela irresponsabilidade dos governantes, o contra poder das ruas e as lideranças de momento. Porque ressaltar o argumento da irresponsabilidade? Por que a política é a ação social em que a responsabilidade representa um papel eminente. Responsabilidade no sentido da obrigação moral do governante para prevenir possíveis erros derivados de suas decisões. Assim, o exercício do poder é que deve atender com mais atenção as conseqüências previsíveis e imprevisíveis de suas próprias ações.

2. Já disso isso Max Weber, em 1919, enquanto a Alemanha sofria o vento da revolução: “A paixão não converte um homem num político, se ele não está a serviço de uma causa e não faça da responsabilidade para com essa causa a estrela que oriente sua ação. Para isso, necessita-se (e esta é a qualidade psicológica decisiva para o político) comedimento, capacidade para deixar que a realidade atue sobre nós, sem perder o recolhimento e a tranqüilidade, ou seja, guardar a distância para com os homens e as coisas. O “não saber manter a distância” é um dos pecados mortais de todo político. () O problema consiste precisamente de como se pode conseguir-se que caminhem juntas nas mesmas almas a paixão ardente e a comedida frieza”.

3. A apropriação de um conceito bélico da política tem também seus efeitos. Se o político não mede as conseqüências possíveis de sua decisão e não atua com comedimento, a distância necessária para governar, própria da definição do regime representativo, se encurta até desaparecer. Mesmo que se procure consolidar uma prática hegemônica, não há obstáculos, nem resguardos. É uma hegemonia nua, paradoxalmente fraca. Falhamos, por tanto, por duplas razões. Num caso, o mais importante, por defeito voluntariamente desejado de um governo que depreciou a deliberação institucional; no outro, por não atender suficientemente os resguardos e as garantias de nossa Constituição. O mais triste dessa história construída a golpes de intemperança, é que, com um mínimo de comedimento, poderiam canalizarem-se os antagonismos e recuperar-se o tempo perdido. Mas o comedimento esteve contaminado por fantasmagóricas percepções que, por todos os lados, viam crescer a hidra da conspiração.

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