domingo, agosto 10, 2008

Senado aberto

A produção legislativa não pode ser comprometida sob nenhum pretexto. A sociedade alimenta uma enorme expectativa e exige - com toda razão - da classe política um Parlamento à altura dos enormes desafios que estão postos à nação brasileira. Nesse sentido, após o breve recesso parlamentar de julho, não hesitei em defender da tribuna a manutenção da rotina dos trabalhos do Senado. Seria um desserviço à democracia estabelecer uma estratégia diferenciada, intercalada por períodos de recesso branco ou de esforço concentrado.
Sem qualquer desdém ao pleito municipal que se avizinha e considerando que apenas três senadores disputam prefeituras, julgo perfeitamente possível dimensionar a nossa participação na campanha nos intervalos dos fins de semana.

Nesse período político de nossa recente história democrática temas cruciais estão em aberto e deveriam ser objeto de debate qualificado nesta Casa. Não podemos ignorar que, no momento, muitas questões vicejam à sombra do Estado e à margem da lei.

Entre as inúmeras vertentes passíveis de debate destaco aquela concernente à fiscalização, prontidão ética a ser exercida na sua plenitude pelo Senado da República. Os escândalos se sucedem e os desvios antigos são relegados ao esquecimento na esteira de desmandos inéditos.

No tocante às prisões efetuadas no âmbito da Operação Satiagraha, a ação de independência e de eficácia da nossa Polícia Federal seguiu a tradição e marca daquela respeitada instituição. Refutei de pronto os questionamentos sobre os métodos utilizados, que procuraram estabelecer uma dicotomia entre espetáculo e eficiência.

Não posso deixar de comentar o lamentável episódio do afastamento dos delegados responsáveis pela investigação de fatos delituosos da maior gravidade. O relatório, fruto de vários anos de investigações, pode até ser questionado, mas é inegável que essa peça foi fundamental para que o mal fosse colocado à luz e o caso devidamente encaminhado ao Poder Judiciário.

Na perspectiva temporal do breve período de recesso parlamentar foi incontornável não enxergar os lances de uma típica operação "abafa", com a participação do Executivo, do Judiciário e da Polícia Federal, culminando com o afastamento do delegado Protógenes e de seus colegas. A apregoada independência dessa instituição foi arranhada em razão dos últimos acontecimentos. A interferência do Poder Executivo foi admitida pelo próprio delegado, caracterizando uma prática reprovável e absolutamente indevida.

Podemos constatar que o "escândalo da vez" substituiu a negociata da Varig, lançada na vala do esquecimento. O Senado não pode se curvar, ignorando a existência de uma operação resultante do tráfico de influência e do favorecimento ilícito. Não podemos esquecer que, diante do plenário da Comissão de Infra-Estrutura, no primeiro semestre, o Senado colheu depoimentos decisivos para a elucidação dos fatos.

A ANAC, na condição de agência reguladora, já deveria ter tomado providências. Essa concessão é irregular. É uma afronta à legislação validar uma negociação realizada sob o manto da influência ostensiva do Poder Executivo. O Senado Federal não pode compactuar com o silêncio obsequioso.

O Governo Federal se abstém de prestar qualquer esclarecimento em face de fatos ruidosos amplamente veiculados na imprensa. A notícia publicada na revista colombiana Cambio, por exemplo, na qual é apontada uma relação estreita das FARC com integrantes do primeiro escalão do Governo brasileiro, não mereceu qualquer desmentido formal do Presidente da República.

Inúmeros outros temas deveriam ser incorporados à pauta de discussões do Senado neste segundo semestre. Sou cético quanto à inclusão da reforma tributária ou política no calendário deste ano. Não há assertividade nem compromisso com o restabelecimento da verdade cabal em nenhuma das instâncias governamentais. A segurança pública é outra frente deflagrada e que exige posicionamento.

Nessa quadra histórica e de tantos impasses éticos e morais não podemos permitir que o Senado da República adote um ‘recesso branco' em razão do pleito municipal, se esquivando do debate de temas vitais à democracia. Propugnamos que o Senado esteja aberto e funcionando a pleno vapor.


Senador Alvaro Dias - 2º Vice Presidente do Senado, vice-líder do PSDB

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