Trechos do artigo do professor da U. de Buenos Aires, Eduardo Fidanza (foto) no La Nacion de 6/8/8. Que os presidentes sul-americanos - alguns - leiam e releiam!
1. O déspota das tragédias aborrece a ciência política. É alheio às táticas e às estratégias que a ciência política constrói, ou aos cálculos que ela realiza para prever a conseqüência das decisões. O poder não é para o déspota um atributo contingente, mas um sinal natural de sua superioridade ou do ditame dos deuses. Trata-se de uma miragem sedutora, que pode arrastar multidões.
2. A alienação não se nota enquanto o êxito está em escalada. Nesse caminho, forja e reforça o vínculo ilusório que o liga ao poder. É empurrado por um estimulante vento favorável, os sorrisos e os aplausos, os constantes triunfos diante de adversários que caem destruídos ou fogem. O povo se identifica com ele, ao percebê-lo como um eleito. O líder se oferece e abre as mãos, que destilam bens e promessas de felicidade para seus seguidores. Ao final da marcha triunfal, o envolve a certeza: as fadas não o enganaram, cumpriram-se as profecias, ninguém pode fazer-lhe sombra, a história cai de joelhos diante dele.
3. Mas o déspota desconfia até mesmo de sua sombra. O poder absoluto gera vazio e angústia. Diante da incerteza, dois atores acorrem em sua ajuda. O tirano os exige com a avidez de adicto. Um é o cortesão, cuja adulação logrará adormecê-lo, sem dar-lhe paz. O outro é o oráculo. Pitonisas e adivinhadores lhe confirmarão, em linguagem cifrada, sua sorte de eleito.
4. O tirano é um jogador empedernido, irremediável: dobrará a aposta uma e outra vez. Não escutará razões, porque ninguém está em condições de oferecê-las; não fará cálculos porque acredita ter ganhado a batalha, antes de travá-la. Detendo o poder, propõe-se a tirar de cena qualquer rival capaz de lançar sombra sobre ele. Para lograr o desígnio, inventa conspirações, atribui culpas a pretensos inimigos, coloca uns contra os outros e procura eliminá-los. Não pode descansar. Teme, no íntimo, ser atraiçoado, tal como ele atraiçoa, despojado como ele despoja. Mas algo ou alguém sempre escapa de seu controle.
5. A tragédia política nunca será uma analogia da democracia moderna. As regras desta última proíbem a morte violenta. As adagas nos sorrisos dos homens são simbólicas e suas desgraças são com freqüências reversíveis. “Hoje, uma promessa, amanhã, uma traição” não conduz a rios de sangue. Na democracia, mais do que tragédias, se representam psicodramas, onde se cria um “como se” nele, em que os homens levam seu desejo de matar até ao limite, evitando consumá-lo.
6. Macbeth não está louco, como muitos acreditam. Sua conduta se regula por uma racionalidade sem matizes, cujas opções são tudo ou nada. A democracia pode ser drama ou comédia, psicodrama ou peça jocosa, nunca um fato irreparável ou uma guerra perpetua. Por isso, se impõe fixar limites, antes que seja tarde, aos líderes que desconhecem o comedimento.
1. O déspota das tragédias aborrece a ciência política. É alheio às táticas e às estratégias que a ciência política constrói, ou aos cálculos que ela realiza para prever a conseqüência das decisões. O poder não é para o déspota um atributo contingente, mas um sinal natural de sua superioridade ou do ditame dos deuses. Trata-se de uma miragem sedutora, que pode arrastar multidões.
2. A alienação não se nota enquanto o êxito está em escalada. Nesse caminho, forja e reforça o vínculo ilusório que o liga ao poder. É empurrado por um estimulante vento favorável, os sorrisos e os aplausos, os constantes triunfos diante de adversários que caem destruídos ou fogem. O povo se identifica com ele, ao percebê-lo como um eleito. O líder se oferece e abre as mãos, que destilam bens e promessas de felicidade para seus seguidores. Ao final da marcha triunfal, o envolve a certeza: as fadas não o enganaram, cumpriram-se as profecias, ninguém pode fazer-lhe sombra, a história cai de joelhos diante dele.
3. Mas o déspota desconfia até mesmo de sua sombra. O poder absoluto gera vazio e angústia. Diante da incerteza, dois atores acorrem em sua ajuda. O tirano os exige com a avidez de adicto. Um é o cortesão, cuja adulação logrará adormecê-lo, sem dar-lhe paz. O outro é o oráculo. Pitonisas e adivinhadores lhe confirmarão, em linguagem cifrada, sua sorte de eleito.
4. O tirano é um jogador empedernido, irremediável: dobrará a aposta uma e outra vez. Não escutará razões, porque ninguém está em condições de oferecê-las; não fará cálculos porque acredita ter ganhado a batalha, antes de travá-la. Detendo o poder, propõe-se a tirar de cena qualquer rival capaz de lançar sombra sobre ele. Para lograr o desígnio, inventa conspirações, atribui culpas a pretensos inimigos, coloca uns contra os outros e procura eliminá-los. Não pode descansar. Teme, no íntimo, ser atraiçoado, tal como ele atraiçoa, despojado como ele despoja. Mas algo ou alguém sempre escapa de seu controle.
5. A tragédia política nunca será uma analogia da democracia moderna. As regras desta última proíbem a morte violenta. As adagas nos sorrisos dos homens são simbólicas e suas desgraças são com freqüências reversíveis. “Hoje, uma promessa, amanhã, uma traição” não conduz a rios de sangue. Na democracia, mais do que tragédias, se representam psicodramas, onde se cria um “como se” nele, em que os homens levam seu desejo de matar até ao limite, evitando consumá-lo.
6. Macbeth não está louco, como muitos acreditam. Sua conduta se regula por uma racionalidade sem matizes, cujas opções são tudo ou nada. A democracia pode ser drama ou comédia, psicodrama ou peça jocosa, nunca um fato irreparável ou uma guerra perpetua. Por isso, se impõe fixar limites, antes que seja tarde, aos líderes que desconhecem o comedimento.
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