
Visto com olhos de hoje, Lula está irreconhecível, exceto pelos clichês que ainda usa. Ele garantiu em todos os momentos daquela campanha que só ele poderia lidar com a questão dos sem terra. Na entrevista que me concedeu em abril de 2002, ele foi além.
— Eu vou lhe dizer uma coisa, e eu vou lhe dizer porque quero que você me cobre. Pode me cobrar em 14 meses. Nós somos a única possibilidade de fazer a reforma agrária sem uma morte e sem uma ocupação. Vamos nos sentar em torno de uma mesa, temos 90 milhões de hectares que não estão produzindo e que poderiam ser usados para a reforma agrária. Vamos fazer um fórum para discutir a questão.
Perguntei sobre os grupos mais radicais e ele respondeu:
— O país tem regras e leis. Não existe espaço para sectarismos. Aí entra o papel do Estado.
Como ele pediu cobrança, aqui está: Lula não apenas não cumpriu essa promessa, como no primeiro ano o número de ocupações pulou de 103 para 222, e as mortes, de 20 para 42. Só nos primeiros três meses de 2006 houve mais ocupações do que em todo o ano de 2002. Por causa da sua ambigüidade, o governo não conseguiu estabelecer a fronteira entre a reivindicação justa e o desrespeito às leis do país.
Na segunda entrevista, o PT já havia divulgado a Carta aos Brasileiros, com promessas de manter a política econômica, mas, nos comícios, o candidato dizia o oposto. Em São Bernardo havia dito, uma semana antes, que iria mudar a política econômica no primeiro dia. Perguntei em qual Lula deveria acreditar.
Por Miriam Leitão em O Globo
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