Trechos do artigo de DANIEL INERARITY - no El País - ES! Talvez tenha faltado lembrar que esse é um foco da imprensa o que estimula os políticos que apenas "suítam" a imprensa, a concentrar-se neles e ganhar destaque como no caso de honestidade, em geral - acusando - apenas e transformando de preliminar de comportamento em qualidade e destaque político.
1. A causa principal de que o apelo aos valores seja hoje tão recorrente tem de ser procurada numa fuga diante da complexidade. Quem não se esclarece alivia seu incômodo, instalando-se em alguma evidência que seja pouco discutível. A queixa moral volta-se para uma situação geral de perda de valores, relativismo, consumismo, desorientação, falta de solidariedade, hedonismo, deslealdade, tradições que se abandonam. Em todas as partes, parecem quebrarem-se estruturas, consensos e autoridades. As classes sociais se diluem e a sociedade perde coesão, as empresas se volatilizam em tramas virtuais, o poder do Estado se debilita, os eleitores são pouco fiáveis. A linguagem dos valores não se usa para fundar direitos, mas sim para questioná-los. Os valores tendem a serem conservadores: família, pátria, ordem segurança, autoridade.
2. O certo é que, há algum tempo, os principais partidos de nossas sociedades democráticas, sejam conservadores ou progressistas, parecem tentados a voltar a abrir um espaço central à defesa dos “valores morais”. Esta apelação desempenhou um papel determinante na reeleição de Bush em novembro de 2004, mas também não se trata de uma peculiaridade norte-americana, pois faz tempo que os valores morais ocupam igualmente um lugar central nas campanhas eleitorais européias.
3. Este fenômeno de "moralização" da vida pública pode ser observado em manifestações muito diferentes, e qualquer um poderia acrescentar muitas outras. Por outro lado, a crescente judicialização da política não tem sua origem na garantia dos direitos e das liberdades, mas sim na proteção de certos valores que entendidos de modo a tornar precários tais direitos e liberdades. Esta ênfase nos ideais e nos valores sobre regras e direitos não deixa de ser significativa. Neste e em outros exemplos, se adverte como o recurso à moral debilita outros pontos de vista e outros níveis de realidade que são muito importantes, como a política ou o direito, cuja lógica específica não se consegue respeitar.
4. De início, o que nesses debates se denominam “valores morais” parecem ser aqueles que concebem tradicionalmente os conservadores e a maneira como os concebem (família, pátria, vida, segurança, mérito, ordem, autoridade), mas não outros, que estão mais no campo contrário e que parecem menos importantes, como serviço público, universalidade, livre consentimento, responsabilidade ou solidariedade. Provavelmente, o fato de a agenda pública se debater acerca dos valores se centre mais nos primeiros do que nos segundos deva ser uma concessão intelectual dos progressistas aos conservadores, uma das mais flagrantes, nem a primeira, nem a única.
5. Ao longo da historia, nós, seres humanos, justificamos até o menos justificável apelando para os valores morais. Mas se deveria perguntar se, com a atual inflação de discursos morais, não se está colocando num primeiro plano algo mais ideológico e inquietante para as democracias contemporâneas. E é que o discurso dos valores pode ser a expressão de um questionamento da prioridade que, numa sociedade democrática, corresponde a direitos, o consentimento, as garantias e as liberdades individuais.
6. Quando há uma débil cultura política, a apelação aos valores em geral, ainda quando esteja aparentemente destinada a fundamentar os direitos e as liberdades, acaba de forma paradoxal no resultado oposto contestando os direitos e tornando frágeis as liberdades individuais. A linguagem dos valores é empregada para reduzir o espaço da política, não para fundamentar direitos, mas sim para colocá-los em questionamento.
1. A causa principal de que o apelo aos valores seja hoje tão recorrente tem de ser procurada numa fuga diante da complexidade. Quem não se esclarece alivia seu incômodo, instalando-se em alguma evidência que seja pouco discutível. A queixa moral volta-se para uma situação geral de perda de valores, relativismo, consumismo, desorientação, falta de solidariedade, hedonismo, deslealdade, tradições que se abandonam. Em todas as partes, parecem quebrarem-se estruturas, consensos e autoridades. As classes sociais se diluem e a sociedade perde coesão, as empresas se volatilizam em tramas virtuais, o poder do Estado se debilita, os eleitores são pouco fiáveis. A linguagem dos valores não se usa para fundar direitos, mas sim para questioná-los. Os valores tendem a serem conservadores: família, pátria, ordem segurança, autoridade.
2. O certo é que, há algum tempo, os principais partidos de nossas sociedades democráticas, sejam conservadores ou progressistas, parecem tentados a voltar a abrir um espaço central à defesa dos “valores morais”. Esta apelação desempenhou um papel determinante na reeleição de Bush em novembro de 2004, mas também não se trata de uma peculiaridade norte-americana, pois faz tempo que os valores morais ocupam igualmente um lugar central nas campanhas eleitorais européias.
3. Este fenômeno de "moralização" da vida pública pode ser observado em manifestações muito diferentes, e qualquer um poderia acrescentar muitas outras. Por outro lado, a crescente judicialização da política não tem sua origem na garantia dos direitos e das liberdades, mas sim na proteção de certos valores que entendidos de modo a tornar precários tais direitos e liberdades. Esta ênfase nos ideais e nos valores sobre regras e direitos não deixa de ser significativa. Neste e em outros exemplos, se adverte como o recurso à moral debilita outros pontos de vista e outros níveis de realidade que são muito importantes, como a política ou o direito, cuja lógica específica não se consegue respeitar.
4. De início, o que nesses debates se denominam “valores morais” parecem ser aqueles que concebem tradicionalmente os conservadores e a maneira como os concebem (família, pátria, vida, segurança, mérito, ordem, autoridade), mas não outros, que estão mais no campo contrário e que parecem menos importantes, como serviço público, universalidade, livre consentimento, responsabilidade ou solidariedade. Provavelmente, o fato de a agenda pública se debater acerca dos valores se centre mais nos primeiros do que nos segundos deva ser uma concessão intelectual dos progressistas aos conservadores, uma das mais flagrantes, nem a primeira, nem a única.
5. Ao longo da historia, nós, seres humanos, justificamos até o menos justificável apelando para os valores morais. Mas se deveria perguntar se, com a atual inflação de discursos morais, não se está colocando num primeiro plano algo mais ideológico e inquietante para as democracias contemporâneas. E é que o discurso dos valores pode ser a expressão de um questionamento da prioridade que, numa sociedade democrática, corresponde a direitos, o consentimento, as garantias e as liberdades individuais.
6. Quando há uma débil cultura política, a apelação aos valores em geral, ainda quando esteja aparentemente destinada a fundamentar os direitos e as liberdades, acaba de forma paradoxal no resultado oposto contestando os direitos e tornando frágeis as liberdades individuais. A linguagem dos valores é empregada para reduzir o espaço da política, não para fundamentar direitos, mas sim para colocá-los em questionamento.
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