A balança de dois pratos em equilíbrio é um dos mais conhecidos símbolos da Justiça. O angustiante desequilíbrio ocasionado por um fator aleatório é o que, em suma, mostra a obra.
Antecipar a decisão provável de um processo judicial sempre foi uma empreitada arriscada. Os advogados sérios, quando solicitados pelos clientes a avaliarem as chances de sucesso de certa demanda, normalmente ressalvam a impossibilidade de estimativas absolutamente seguras. De uns tempos para cá, o grau de imprevisibilidade das decisões judiciais parece ter aumentado bruscamente e os profissionais da área cada vez mais se surpreendem com o resultado das demandas. Lamentando-o ou comemorando-o, são surpreendidos porque, pelo conhecimento da lei e dos precedentes jurisprudenciais e pela experiência profissional que tinham, nutriam expectativa diversa para o caso. Quem não é profissional da área também estranha. À maioria das pessoas será, hoje, familiar a notícia de dois processos idênticos decididos de modo oposto. Em suma, uma certa margem de imprevisibilidade nas decisões judiciais é suportável e até mesmo inevitável. Mas se esse grau de imprevisibilidade se acentua em demasia, põe-se em risco a segurança jurídica.
Na economia globalizada, os investidores têm o mundo todo para investir e norteiam suas decisões levando em conta também a estabilidade dos marcos institucionais nos países que escolhem. Se é considerável o risco de a norma regente do investimento não ser aplicada pelos tribunais ou receber neles uma nova interpretação, o investidor não terá o retorno estimado e tenderá a redirecionar suas opções para outros países, em que tais distorções sejam menos freqüentes.
A imprevisibilidade das decisões judiciais, ao atingir níveis críticos, pode desequilibrar a economia de qualquer país. Os investidores, atentos à elevação do risco, tendem a não se contentar com retornos razoáveis. Ao invés de investidores de longo prazo, esse desequilíbrio acaba atraindo especuladores, "risk makers", interessados unicamente em aportar seus capitais onde terão, a curtíssimo prazo, o melhor retorno.
O Brasil, compete pelos investidores. Não podemos ignorar a importância que a maior ou menor estabilidade dos marcos institucionais representa no contexto dessa competição. Reduzir o grau de imprevisibilidade das decisões judiciais e, com isso, contribuir para a maior estabilidade do marco institucional é tarefa principalmente dos profissionais do direito - os juízes, em particular.
Essa responsabilidade não pode ser transferida a ninguém mais: economistas, legisladores ou mesmo o governo pouco ou nada podem fazer a respeito. Os profissionais jurídicos são treinados para focarem os litígios em sua individualidade, esses profissionais raramente notam os efeitos macro-institucionais que os cercam. A reversão desse quadro também é tarefa exclusiva dos advogados, juízes, promotores de justiça e demais profissionais do direito. Estimulá-los a se preocuparem com as repercussões das decisões judiciais na criação de um ambiente institucional que atraia os investimentos produtivos de longo prazo é o primeiro desafio a enfrentar, se quisermos que, no Brasil, a Justiça não desequilibre a economia.
por Fábio Ulhoa Coelho (Jurista e professor titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo)
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